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temáticas motoras e mecanizadas, por meio de repetição e memorização das letras, das sílabas,
das palavras, ou seja, longe dos contextos em que poderiam ser praticadas.
Até agora, você já deve ter percebido a presença constante dos termos alfabetização e letramen-
to durante a leitura deste texto. Mas o que é alfabetização? O que é letramento? Magda Soares
ajuda-nos a compreender esses conceitos no seguinte trecho de uma entrevista:
Se alfabetizar significa orientar a criança para o domínio da tecnologia da escrita, letrar significa
levá-la ao exercício das práticas sociais de leitura e de escrita. Uma criança alfabetizada é uma
criança que sabe ler e escrever; uma criança letrada (...) é uma criança que tem o hábito, as
habilidades e até mesmo o prazer de leitura e de escrita de diferentes gêneros de textos, em
diferentes suportes ou portadores, em diferentes contextos e circunstâncias. Se a criança não
sabe ler, mas pede que leiam histórias para ela, ou finge estar lendo um livro, se não sabe
escrever, mas faz rabiscos dizendo que aquilo é uma carta que escreveu para alguém, é letrada,
embora analfabeta, porque conhece e tenta exercer, no limite de suas possibilidades, práticas
de leitura e de escrita. Alfabetizar letrando significa orientar a criança para que aprenda a ler
e a escrever levando-a a conviver com práticas reais de leitura e de escrita: substituindo as
tradicionais e artificiais cartilhas por livros, por revistas, por jornais, enfim, pelo material de
leitura que circula na escola e na sociedade, e criando situações que tornem necessárias e
significativas práticas de produção de textos. (SOARES, 2004, p. 17).
Assim, depreende-se disso que é possível ser letrado sem ser alfabetizado, isto é, o indivíduo é
analfabeto, mas é letrado. Um termo que às vezes se confunde com o conceito de letramento
é o alfabetismo funcional. Este é considerado por Soares (2014) como uma versão fraca da di-
mensão social dada pelo conceito de letramento (versão forte da dimensão social). Ela explica
que, aparado por uma perspectiva progressista e liberal, o alfabetismo funcional (ou letramento
funcional) “é definido em termos de habilidades necessárias para que o indivíduo funcione ade-
quadamente em um contexto social” (SOARES, 2014, p. 72, grifo da autora).
Chamamos atenção para o termo funcional que leva um indivíduo adaptado socialmente e que
usa e a leitura e a escrita a funcionar adequadamente em sua sociedade.
Porém, a versão forte de letramento defende que:
Letramento não pode ser considerado um “instrumento” neutro a ser usado nas práticas sociais
quando exigido, mas é essencialmente um conjunto de práticas socialmente construídas que
envolvem a leitura e a escrita, geradas por processos sociais mais amplos, e responsáveis
por reforçar ou questionar valores, tradições e formas de distribuição de poder presente nos
contextos sociais (SOARES, 2014, p. 75)
Assim, letramento não seria um “instrumento que as pessoas simplesmente lançam mão para
responder às exigências das práticas sociais” (LANKSHEAR, 1987, apud SOARES, 2014, p. 75).
E como fica a alfabetização?
1.2.1 O processo de alfabetização
No Brasil, foi somente após a proclamação da República que as práticas de leitura e escrita
começaram a ser sistematizadas no âmbito escolar, sendo que a escola passa a ser considerada
uma importante maneira de modernizar o Estado-Nação, levando o esclarecimento à popula-
ção não alfabetizada. A leitura e a escrita passaram a ser compreendidas como “tecnicamente
ensináveis” e, assim sendo, deveriam ser ensinadas sistemática e intencionalmente, necessitando
para isso de pessoas especializadas para tal (MORTATTI, 2006).
O conceito de alfabetização vigente no âmbito escolar, no final do século XIX, era o de ensinar
habilidades para codificar e decodificar “[...] mediante a criação de diferentes métodos de alfa-
betização – métodos sintéticos (silábicos ou fônicos) x métodos analíticos (global) – que padroni-
zaram a aprendizagem da leitura e da escrita” (ALBUQUERQUE, 2007, p. 11-12).
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